Agosto, setembro e outubro foram meses de muitas emoções.
Mahal fez a prova para seu terceiro cordel de capoeira e ficou muito feliz por mais essa conquista. Ao terminar, saiu abraçando todo mundo com a sua forma muito carinhosa e expressiva de interagir. Desde pequeno, ele faz parte da comunidade e tem familiaridade com os capoeiristas, mas não somente com eles. Também em outros contextos, nas lojas e cafés que frequentamos mais assiduamente, ele se sente muito à vontade, conhece os funcionários pelo nome e costuma saudar e abraçar a todos sempre que passa por ali. Até mesmo quando não entramos, ele pede para esperarmos e faz questão de rapidamente cumprimentar todo mundo.
Em agosto chegaram alguns amigos da Itália e Mahal viveu sua primeira experiência de amor platônico, que ele mesmo chamou de “crush”, com uma menina chamada Coci, que tem o dobro de sua idade. Recebemos também, pouco após a volta do pai de uma longa viagem a trabalho, a visita dos parentes que moram na Alemanha, uma visita muito esperada por Mahal. Vovó Leda também ficou muito agitada e teve algumas crises de nervosismo. A chegada dos tios e primos já adultos foi, ao mesmo tempo, uma grande alegria e uma forte decepção. Mahal percebeu que eles vieram também para se divertir entre eles e descansar e não para brincar com ele o tempo todo. Começou a apresentar um comportamento bastante agressivo e se fechar em demorados acessos de mau humor. Não foi a primeira vez que aconteceu, mas havia uma intensidade maior e estava demorando mais tempo para passar. Ao mesmo tempo, ele estava fazendo um tratamento a longo prazo, receitado pelo pediatra, para uma alergia recorrente, o que também estava afetando seu bem estar. Chegamos a falar com a amiga da família que veio junto e, por acaso, era psicóloga. De acordo com a experiência dela no trabalho com crianças autistas, ela excluiu a possibilidade de autismo, mas como há casos de bipolaridade na família paterna e depressão na família materna, sugeriu um acompanhamento psicológico no futuro.
Em setembro, começou a nossa grande viagem, também um desafio para ele, pois fazia tempo que não viajámos. Seu mundo se expandiu de repente em uma miríade de estímulos. Mahal continuou alternando entre sua tendência a ser extremamente comunicativo e amoroso e seus acessos de raiva. A falta de descanso, as longas horas de viagem, a chegada a um lugar desconhecido, a saudade de tudo e todos, de que ele falava repetidamente, a irritabilidade do pai ao montar uma exposição de artes em uma nova cidade, as brigas frequentes dos pais entre si, levaram a uma espécie de colapso emocional nos primeiros dias. Mahal entrou em forte sofrimento, por algumas horas estagnou emocionalmente, não queria ser tocado por nós, repetia que não era amado, chegou a falar em se matar. Foi uma experiência extremamente difícil e dolorosa para todos nós, e foi apenas com grande esforço e atenção que conseguimos reverter aquele estado. Algumas horas depois, descobri todos os comportamentos apresentados por ele nas reações adversas raras da bula do remédio que ele estava tomando, que descontinuei imediatamente.
Depois disso, as coisas começaram a melhorar e pudemos fazer muitos passeios e descobertas pela cidade. As semanas que seguiram trouxeram diversos e novos aprendizados.
Em outubro, Mahal passou a distinguir entre arquitetura antiga e moderna. Descobriu que Paris abrigou uma grande revolução em que as pessoas foram para as ruas e reivindicaram seus direitos e o fim da monarquia. Conheceu monumentos e construções históricas, se espantou com estátuas e detalhes em ouro maciço. No Musée des Invalides, descobriu canhões de guerra e ouviu falar sobre Napoleão pela primeira vez. Em outros museus descobriu que as pinturas e esculturas eram uma forma de documentar o tempo em que nasceram, surpreendeu-se com as roupas, as guerras, o tipo de luz, a nudez, as imagens simbólicas.
Alegrou-se com mais uma visita da família, desta vez um pouco mais fluida do que o encontro em agosto. Aprendeu a patinar. Participou com alegria da vernissagem do pai. Acentuou-se sua tendência a se aproximar de meninas mais velhas que lhe parecem bonitas ou interessantes. Percebeu que abraçar estranhos não dá sempre certo, como quando abraçou uma jovem chinesa que levava o cachorrinho em um carrinho de bebê; ela não só não gostou do abraço como se assustou muito. Conversou com todo tipo de pessoas: um velhinho que dava comida a corvos, uma senhora que cantava e manuseava um instrumento medieval no parque, skaters, patinadores, acrobatas, algumas chinesas sentadas na praça, famílias que praticam a desescolarização, amigos e conhecidos do papai e da mamãe.